Quem casa, quer casa!
Minha casa, minha vida!
Sonho da casa própria!
Viva o sonho americano e construa sua casa.

Quando eu morava no Brasil, sempre ouvia que o sonho de todo brasileiro era ter sua casa própria.

A casa é um bem importante para se viver, construir um futuro, faz parte de ter uma família e a certeza de que somos bem-sucedidos.

Quem não se sente importante em dar entrada na parcela do apartamento ou conseguir o tal do financiamento.

Não estou aqui para falar das milhares de famílias que não têm onde morar. Compartilho da dor delas, mas isso não é o ponto de discussão neste texto.

Fui chamada para participar desse projeto e ser colunista de edição digital de periódico para falar justamente das diferenças existentes entre o Brasil e a França, país que moro.

Há tanto o que dizer, tantas diferenças, então por onde começar?

Pensei em escrever sobre as minhas inquietações atuais E, nesse ponto, a questão da moradia é latente.
Estou falando de CASA, HOME, MAISON, não estou falando de imóveis.

Imóveis a gente compra como investimento; já casa, para morar e ser feliz na cidade que escolhemos para viver.

Segundo a revista Forbes, Paris é a sétima cidade com o metro quadrado mais caro do mundo – sendo a primeira Mônaco (cidade também francesa), seguidas por Hong Kong, New York, Londres, Singapura e Genebra.

Então comprar um apartamento em Paris, é quase impossível ! Para se ter uma ideia, veja a reportagem referente a venda de um apartamento, no centro de Paris, com 1.4m2 (Sim, menos de 2 metros quadrados !) é vendido por 48 mil euros:

 

 

 

Então, qual a solução ? ALUGAR! Além dos inconvenientes reais de um aluguel, você nunca poderá mudar algo realmente na sua casa, nunca poderá ter a experiência de personficar o seu lar – sem passar pela autorização de terceiros (desde mudar a cor de uma parede, quebrar uma parede para fazer uma cozinha americana ou apenas ter a sensação de que não está pagando por algo que não te representa e nunca será seu !).

Mas como alugar em Paris? Não é nada fácil!

Primeiro, você precisa ser um candidato ideal. Sim, o aluguel de um apartamento a Paris é muito mais difícil que passar em um teste para o emprego dos seus sonhos.

Para passar da PRIMEIRA barreira da seleção e COMEÇAR a visitar os apartamentos, é necessária a criação de um dossiê, como em uma entrevista de emprego. Os donos de apartamentos em Paris, recebem pilhas e pilhas de currículos em forma de dossiê e só então, eles decidem quem terão as chances de visitar o apartamento.

Esse dossiê é composto por documentação obrigatória, além de todos os documentos extras que você possa fornecer, como atestado de trabalho, ultimo imposto de renda e um fiador, somente para ser aceito para visitar o apartamento!!

Existem especialistas, sites e coachs somente para ajudar a criar esse dossiê, a explicar quais documentos aumentam suas chances de ter, AO MENOS, seu dossiê lido.

Meu marido, assim como eu, somos brasileiros. Quando ele usava seu sobrenome Bensabath no seu currículo, não recebia nenhuma oferta por ser um nome tido como árabe. A partir do momento que ele começou a usar Lima, recebemos 10 ligações na mesma semana.

De acordo com um teste realizado pelo laboratório de pesquisa CNRS Trabalho, Emprego e Políticas Públicas (TEPP), publicado em dezembro de 2017 (um método que compara as taxas de sucesso entre aplicações fictícias), a probabilidade de êxito nunca visitia a imóvel de um perfil com nome de origem árabe é de quase 27% inferior à do que um perfil de origem francesa, ainda que se tenha utilizado da mesma mensagem para os mesmos anúncios.

As evidências mostram que a discriminação não é necessariamente a mesma, dependendo da pessoa. Há cruzamento de preconceitos com base na raça, bem como em gênero ou religião.

Alterar seu nome em um dossiê, às vezes, é a única solução para uma pessoa negra, árabe ou estrangeira encontrar um apartamento, mesmo sendo totalmente obrigatório ganhar 3x o valor do aluguel para se poder finalizar o contrato,

Um individuo negro, árabe ou estrangeiro, ao entrar em contato e enviar o dossiê, tem as possibilidades de êxito na locação extintas (muitas vezes sob a alegação de indisponibilidade dos imóveis). Porém, ao pedido para que amigos franceses façam as reservas, as portas se abrem novamente.

Diante de inúmeras recusas, a pessoa se sente encurralada, sem saber mais qual subterfúgio usar em seu dossiê para alugar uma lata de sardinha com valor exorbitante. Como exemplo, nesse anúncio, tem como critério: “Não ter origens árabes (sim, vocês leram corretamente)”.

 

 

 

Uma pesquisa realizada pela ONG SOS Racisme em Paris mostra que os candidatos africanos, norte-africanos (árabes), asiáticas entre outros estrangeiros que procuram acomodações são discriminados por proprietários e agências imobiliárias.

Então, como ter uma casa, em uma situação dessas?

Muitos brasileiros que conheço recorrem ao aluguel informal.

Em Paris, existe uma lei, que não permite o aluguel de locais com menos de 10m2, porém, muitas pessoas alugam em contratos informais às pessoas que não precisam se submeter ao longo procedimento de aprovação (que muitas vezes parece um concurso !)

Logo, brasileiros, bem como outros estrangeiros, alugam quartos em residência de terceiros ou quartos no último andar do imóvel (chamados de quartos de empregada). Outra saída são os studios de menos de 10 m2 por um preço muito maior do que o de um apartamento inteiro. Tais pessoas serão, ainda, consideradas « sortudas »  ! Pois pode ser pior, como no caso de G.D., antigo barbeiro do meu marido, que pagava o preço de equivalente ao aluguel de um apartamento para dividir um quarto com mais 8 pessoas. Ou pode ainda ser muito pior: um mini studio feito de vaga de garagem Box (como ma foto abaixo), – vaga mais cara do que o próprio carro.

 

 

 

Trata-se de uma realidade muito triste, na Cidade Luz onde seguimos ansiando o SONHO DA CASA PRÓPRIA.

 

Autora: Rafa Keka, colunista e correspondente internacional (França).

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