Tem (muita) gente com fome no Brasil, foi o que revelou uma pesquisa publicada nesta semana no jornal Folha de São Paulo. São 33 milhões de brasileiros famintos, mais de uma dezena de milhões estão ansiosos e desesperados, todos desorientados, alguns descrentes. São três Portugais inteiros sem perspectivas de uma alimentação segura e isso é muito grave para um país que leva alcunha de “Celeiro do Mundo”.
Na bagunça que virou as nossas vidas de uns anos para cá, as placas que clamam por pedidos de ajuda e denunciando explicitamente a fome nos lares param o trânsito e se misturam aos carros e motos, muitas delas são imperceptíveis na cegueira do cotidiano. Isso é uma mostra diária de que conseguimos retroceder ao cenário que remete o inicio dos anos 90 graças a (não) política adotada nos últimos anos de não estocar alimentos, voltando as ações para a exportação. Coincidência ou não , no inicio de 2019, o Consea (Órgão que sugere diretrizes para o plano da segurança alimentar) foi esgarçado pelo atual presidente.
De lá para cá, o Brasil retornou ao tão temido Mapa da Fome e os agroexportadores começaram a lucrar com os incentivos às exportações, uma vez que, em plena pandemia, o governo federal liquidou com as reservas de grãos. Esse predativismo, aliado a situação entre a Rússia e a Ucrânia, foi a bala de prata para que o atual governo possa obter um resultado bem desastroso e que vai impactar na eleição de Jair Bolsonaro.
Já nas grandes cidades, a situação é grave. Muitos entram nos coletivos sem saber o que pedir, tamanho o desespero que a escassez de comida e emprego provoca. Entre os lamentos de socorro, de quem tira o parco sustento através da venda de doces comprados em bombonieres, as gotas de indiferença pairam no ar e os ouvidos viram moucos por detrás dos fones plugados nos celulares, querendo esconder o incomodo sentido, uma vez que o tal “silencio da viagem” foi quebrado . Nem a fome sensibiliza o cansaço produzido pela apatia, pois a vida entrou no automático da ciranda robotizada do cotidiano.
O tamanho da indiferença sintomática, que afeta a nossa sociedade, está na declaração do senador Flavio Bolsonaro (PL-RJ). Lustrando uma cara de pau, o filho 01 do atual presidente minimizou os dados apresentados pela pesquisa feita pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, alegando que quem recebe os R$ 400 do Auxilio Brasil pode até passar dificuldades, mas não fome.
Em contrapartida a esta declaração, nos recônditos dos lares de um país esquecido, tem gente com despensa vazia, geladeira que mais parece uma igreja e fogão que… (esquece essa gente voltou a cozinhar com querosene). Tem gente com fome e com a barriga vazia não se brinca, nem mesmo com quem recebe o tal “paliativo calça curta” do auxilio que substitui o Bolsa Família. Alias, não se brinca com todas as fomes, até mesmo com aquela que precisa ser bem saciada diante dos males causados pelas maquinas oficiais de fake news, a do conhecimento.
O fato é que, no Brasil de hoje, todas as fomes precisam ser sentidas. Todas as fomes precisam ser saciadas, todas de uma vez ou não. São todas em uma só ou uma fome de cada vez. E nessa carência de tudo, vivemos a deriva da falta de perspectiva.
Infelizmente, a fome está deixando as sequelas de um Brasil, que já viveu, recentemente, o apogeu de política positivas de Segurança Alimentar, sem esperanças.
Tem gente com fome
E você? Tem fome de que?