O carnaval de Salvador já teve o seu apogeu. Em um determinado momento, os blocos de rua conseguiram transpor as barreiras sociais, colocando muita gente junta na folia na cidade, em uma época em que os bailes carnavalescos em clubes sofriam a decadências que custou, inclusive, o fechamento destes espaços.

No tempo dos grandes bailes carnavalescos, a elite baiana quase não frequentava as ruas. O povo pobre era o folião pipoca com seus blocos, cordões e charangas, com travestidos, mortalhas feitas muitas vezes em casa, caretas, e a alegria corria solta, apesar da separação.

Com o aparecimento dos grandes blocos, com seus famigerados abadás, a elite baiana transformou estas agremiações em seus bailes itinerantes. Com a diferença que a partir deste momento, as paredes dos clubes passaram a ser feitas de gente pobre e preta. A figura do “cordeiro” se transformou na marca mais forte do apartheid que se tornou o carnaval de Salvador, nos últimos anos.

Hoje, a folia momesca tem o foco no turista que paga verdadeiras fortunas, sobretudo os retardatários, para terem seus momentos de extravasação, seguros por baianos que disputam vagas para serem o cercado de “negro a pique” que os protege do envolvimento com a cultura e a miséria local.

Não satisfeitos com a possibilidade de algum contato com “esse povinho”, inventaram, com a anuência dos poderes públicos e dos consagrados artistas locais, os camarotes. Que são verdadeiros resorts, em plena avenida. Aumentando mais ainda a segregação espacial e diminuindo as áreas já escassas do folião pipoca, que não pode ou não quer vincular-se a estes blocos e ainda causando transtornos ao caótico trânsito da capital.

Não sabemos no que se tornará o carnaval de Salvador. Talvez medidas contingencias como as que foram tomadas em Olinda e Recife não mais sejam aplicáveis, no sentido de manter alguma tradição local, devido ao tamanho que este monstro chegou. Parece que é um processo desenfreado, em que o baiano pobre jamais poderá experimentar a sua festa como protagonista.

Sócrates Magno Torres.

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