Por um instante, pensemos que Jesus voltou, assim como desejam os neopetencostais mais ardorosos. Visualizemos ele nos dias de hoje em meio a guerras e conflitos. Como reagiria o rabi da Galileia ao perceber o discurso de ódio de uma turba inflamada pelos algoritimos das redes sociais, da onda de cancelamentos que desvalorizam a existência do outro?
Pois bem, em meio a tanto avanço tecnológico, onde podemos dar comandos com um toque na tela dos nossos aparelhos móveis ou por meio de nossa voz, percebo que não estamos,moralmente falando, longe da época onde o Cristo viveu,passados vinte séculos. Jesus veio para uma sociedade marcada pela barbárie e pela opressão, conduzida por um sistema de dominação corrompido pela corrupção, que teve na violência e na censura o seu mecanismo de coerção. Ele acolheu aqueles que eram os alvos do Império Romano e dos doutores da lei,enfrentou os moralistas religiosos e, mesmo assim, foi perseguido e morto pela hipocrisia dos seus convivas religiosos.
Se olharmos para os dias atuais, Jesus Cristo faria o mesmo. Ele traria para si os mais vulneráveis, aqueles que sofrem, de forma sistemática, com a mão pesada do preconceito e da intolerância em todas as suas nuances. Acolheria as mulheres, que são vítimas constantes do machismo que move o sistema, abraçaria as vítimas da perseguição religiosa, que destroem templos e credos. Além disso, o Messias se revelaria naqueles que sofrem ataques de capacitismo, racismo, xenofobia e homofobia, trazendo – os para o seu manto de amor.
No tempo em que esteve entre nós, Jesus sempre viveu o mundo, saiu das paredes dos templos para pregar nas vias públicas,nas praças, na beira de um rio e no monte. Durante sua passagem, denunciou a exploração indevida da fé para fins financeiros ao expulsar os vendilhões do templo, foi justo ao livrar uma adultera de um julgamento moral e violento, repartiu, de forma igual, o pão e curou leprosos, além de outras ações. Mesmo assim, nada ofusca os seus ensinamentos, que utrapassa os tempos de forma intocável.
Não seria ousado afirmar que, dentro da nossa concepção de atualidade,teríamos um Jesus high-tech, que,possivelmente, estaria inserido em um meio interativo dentro de sua proposta de acolhimento. Entretanto, diante de um tempo em que estamos vendo a preconizado da inteligência artificial, a tentativa de recriar esse personagem intrigante seria algo complexo em meio a sua essência, que rompeu com as barreiras do falso moralismo dos doutores da lei, hoje assumido pela histeria de sacerdotes neopetencostais a serviço de um Cristo não cristão.
Atualmente seria impossível revive-lo sem a rebeldia amorosa e libertária de um tempo onde a tirania, a barbárie e a dominação predominavam nas relações.Se vivo em carne, nos dias de hoje Jesus lutaria pela dignidade de ser quem se é, desafiaria os algoritimos e, para além deles, instituiria na sua mensagem que o ser humano não merece ser humilhado em seus erros, reforçando a tese de que “aquele quem estiver sem pecado, que atire a primeira pedra”. Em suas atitudes, teríamos uma verdadeira cruzada moral contra a cultura do cancelamento, onde seríamos levados a refletir que para respeitar e ser respeitado deveremos “amar os nossos inimigos, bendizer os que vos maldizem e fazer bem aos que vos odeiam.”.
Jesus, nos duas de hoje, quebraria com a lógica nefasta das redes sociais. Sua mensagem desafiaria os anarcocapitalistas e os protofacistas de sapatenis. Infelizmente, dada a incompreensão de muitos, ainda presos a um ideário narcisista, seria novamente apedrejado e… cancelado. Isso mostra que a nossa evolução moral foi ínfima. Assim,aos trancos e barrancos, a humanidade vai caminhando.