Cabe salientar, com precocidade, que alguns dizeres podem lhe causar ativação de gatilhos, se você espera uma fábula com final feliz, não será esta a abordagem, mas mesmo assim lhe convido a compartilhar esta ideia.
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E na última quinzena de março, a quarentena começou e a gente achou que logo ia acabar – o tratamento iria acontecer, o vírus iria sumir, a vacina iria chegar. Veio o home office, modificações de rotina, distanciamento aos queridos, restrição ao convívio social e uma enxurrada de informações por todos os lados. No início, toda novidade era bem-vinda, as lives eram acontecimento irrefutáveis. Contudo, a solução que permanecia mais viável era ficarmos em casa e em isolamento, e assim se passaram 100 dias e mais…. Um milhão de casos, sessenta mil mortos. E assim abrimos o sétimo mês, o meio do ano, com um prognóstico bem reservado. Quando a gente acha que nada mais nos toca, e que já passamos pelo pior, acordamos com mentiras sobre ministros, falácias sobre curas para a COVID-19, sem nomeação ao condutor do ministério da saúde (isso já é normal) e com pessoas vivendo o “novo normal”.
Particularmente, eu detesto esse termo (novo normal), não acho que o ser humano está apto à modificação em tão reduzido período de tempo… sou Darwiniana demais para isso. Consonante ao meu pensamento, acordamos com notícias de um nicho de população ocupando bares e restaurante do Rio de Janeiro. Acho que isso adoeceu um pouco mais a todos que estão em casa, uma vez que é difícil perceber que seus iguais ignoram a doença, a morte, o sofrimento.
Sinceramente, a maior pandemia é o próprio ser humano, e no leito da agonia ou da morte, espero que seja lembrado sobre o conceito de ser vítima-algoz: analogia ao livro (o qual me desenvolveu uma memória de asco), onde descreve-se que os verdadeiros prejudicados são os que promovem o sofrimento.
Quando a quarentena começou, eu sabia que ela não teria sucesso. O brasileiro é acostumado demais com a morte diária, a normalização da morte iria acontecer. A curva da morte amedrontava, mas ela não era maior do que a curva da falta de empatia e de solidariedade. A espécie humana foge de qualquer curva que possamos, nós cientistas, com doutorado ou não, estudar. Ela supera, decepciona, nos deixa descrentes.
Em uma pitada sofisticada, no Brasil temos diversas sentenças que compõem uma equação para enaltecer uma propagação viral: desigualdade social + DESGOVERNO + falta de acesso a saúde + falta de acesso à educação + cultura da negligência + cultura da alienação + cultura da mais-valia + “morrem tantos todos os dias”.
Aqui, qualquer epidemia vencerá, e o humano é a pior delas.
No dia 28 de outubro de 2018, ao fim do pleito eleitoral, meu irmão me disse sabiamente: “o que nos resta é cuidar dos nossos”, será isto que nos resta? – me pergunto. Bem, este não é um texto de opinião, mas sim um testemunho de descontentamento.
E entre os afagos de amor em meio a quarentena, recebi esta música de um amigo… julgo músicas e poesias um dos melhores presentes que podemos oferecer ao outro. Comungo com vocês o real sentimento que possivelmente parte dos brasileiros tem neste momento, retratado em uma música cantada por Flaira Ferro:
“Fiz em mim uma faxina e encontrei no meu umbigo, o meu próprio inimigo, que adoece na rotina.
O ser humano é esquisito, armadilha de si mesmo. Fala de amor bonito e aponta o erro alheio. Vim ao mundo em um só corpo, esse de um metro e sessenta, devo a ele estar atenta … não posso mudar o outro.
Mas se eu não tiver coragem pra enfrentar os meus defeitos, de que forma, de que jeito eu vou me curar de mim?
Se é que essa cura há de existir
Não sei.
Só sei que a busco em mim”